Artes & manhas | Algumas reflexões sobre os afetos

Atualmente, nossas almas estão tomadas por uma porção de notícias ruins, precisando lidar com fatos que envolvem violência, corrupção e outras formas de maldade, principalmente pela difusão de mentiras que se não nos atingem diretamente num primeiro momento, certamente terão efeitos sobre todos nós no futuro.

Temos algo que nos faz diferentes dos crocodilos, além de não termos cauda, não sermos verdes e não rastejarmos feito répteis: é o fato de que nossas lágrimas são geradas por emoção ao contrário das deles que só acontecem quando estão devorando suas vítimas.

Precisamos entender que não somos formados apenas por um conjunto de órgãos. Além dos vasos sanguíneos e do músculo do coração que nos alimenta de vida, nos fornecendo o oxigênio necessário ao corpo, também possuímos sentimentos que nos fazem estabelecer relações de afeto que ao longo do tempo, no transcorrer da vida, criam laços indissociáveis com a nossa capacidade de sentir amor e alegria.

Enquanto o choro do crocodilo é apenas uma reação fisiológica, pois enquanto suas mandíbulas se dilatam para engolir a presa sua fossas lacrimais são comprimidas, o nosso choro e o nosso riso vêm de sentimentos mais profundos do que uma garfada de comida. Ele brota na alma, por sentimento de perda, compensação, amor, carinho, reconhecimento ou aprovação.

O choro do crocodilo não exprime sentimento algum, poderia ser chamado de falso ou fingido, como aquele das teatrais carpideiras que antigamente eram contratadas para os velórios, pois não reflete qualquer expressão de bondade e compaixão com relação ao próximo.

Assim, penso que neste momento em que o mundo passa por uma situação muito complicada, com guerras inúteis e extermínios inexplicáveis de populações indefesas, deveríamos protestar contra qualquer tipo de vã violência, guardando nossas sinceras lágrimas para os momentos particulares de conciliação ou reconciliação: para o abraço ou o beijo inesperado.

Como sempre fui otimista, ainda acredito na construção de um mundo melhor, não sem lágrimas dolorosas, não sem dificuldades, mas com muito mais bondade, compaixão e solidariedade em relação ao próximo.

Seria muita burrice nos compararmos aos crocodilos, que apenas choram quando se alimentam e não sentem nenhuma outra emoção além da barriga cheia.